21 de maio de 2011, Terra Magazine http://terramagazine.terra.com.br (Brasil)
Marcela Rocha
"Os palestinos não têm nenhuma ilusão de que os israelenses se retirariam para a fronteira original de 1967. Qualquer palestino que declare isso como ponto de partida está fechando as portas para negociar. Isso vale tanto quanto a posição do Hamas de eliminar o Estado israelense".
A avaliação é de Samuel Feldberg. Cientista político da Universidade de Tel Aviv e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. É pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo, onde se dedica às questões do Oriente Médio e do LEI - Laboratório de Estudos sobre a Intolerância.
Na entrevista abaixo, o professor faz uma análise do discurso do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Em longo discurso sobre o Oriente Médio, proferido nesta quinta-feira (19), o estadista americano afirmou pela primeira vez que as fronteiras entre Israel e um futuro Estado palestino devem se basear nas traçadas em 1967, "com trocas mútuas e acertadas de forma que fronteiras seguras e reconhecidas sejam estabelecidas nos dois Estados".
Para Feldberg, o discurso é vago e não aponta para nenhuma mudança num horizonte próximo. "Não acrescentou nada de concreto". No entanto, pode ser útil para países em conflito como Egito e Síria.
Confira:
Terra Magazine - O que o senhor achou do discurso do Obama?
Samuel Feldberg - De maneira geral, ele reafirmou a defesa - por parte dos EUA - das manifestações em prol da democracia nos países do Oriente Médio. Ele deu também um apoio moral para as populações que estão se manifestando. Mas eu não vi nenhum elemento revolucionário nas declarações dele. Foi um discurso muito bem feito, muito bem elaborado. Mas do ponto de vista de um analista que conhece essas questões, achei monótono. É raro eu concordar com um porta-voz do Hamas, mas nesse caso, concordo com o que ele disse: Discurso não importa, mas o que importa são os passos que os EUA vão dar.
Quais passos o senhor acredita que serão dados?
Eu não acho que será dado nenhum passo pró-ativo. Os EUA estão sinalizando com promessas de reações ao que está acontecendo.
Alguns analistas dizem que o discurso aponta para a manutenção do favorecimento de Israel...
Os palestinos não têm nenhuma ilusão de que os israelenses se retirariam para a fronteira original de 1967. Qualquer palestino que declare isso como ponto de partida está fechando as portas para negociar. Isso vale tanto quanto a posição do Hamas de eliminar o Estado israelense.
O que há de novidade?
Tenho a impressão de ser a primeira vez que um presidente dos EUA enfatiza a desmilitarização do Estado palestino. Isto, certamente, vai de encontro a uma das principais reivindicações de Israel.
O senhor acha que isso seja possível num horizonte próximo? Tanto a desmilitarização quanto um acordo?
Não vejo isso em nenhum horizonte próximo. Essa não será uma condição negociável para o israelense, que não aceitará a criação de um Estado se ele for militarizado. Obama também alertou os palestinos para o fato de, caso declarada unilateralmente as questões do Estado e caso procurem o apoio das Nações Unidas, indicaria, então, um veto dos EUA no Conselho de Segurança. Isto porque na Assembléia Geral os palestinos conseguem votos suficientes. Tem alguns pontos que dá para pinçar do discurso que são perfeitamente a favor de Israel.
Por exemplo?
O Estado desmilitarizado, as fronteiras de 1967 com negociações sobre trocas de território, a questão da Assembléia Geral e o aviso do abandono do terror, porque senão as negociações não avançarão.
Para quê serviu esse discurso?
No meu ver, absolutamente nada. Não acrescentou nada de concreto. Eu acho que um item importante é a fragilidade do Egito que pode se evidenciar nas futuras eleições. O presidente Obama prometeu recursos aos países árabes, mas ele não tem de onde tirar esse dinheiro, porque o orçamento dos EUA está completamente estourado. Se isso for gerar uma espécie de Plano Marshall no mundo árabe, essas expectativas serão frustradas. Isto levaria, certamente, a novas manifestações.
O senhor acha que o discurso, então, foi muito mais direcionado a países como o Egito do que para Israel e Palestina?
Acho que foi muito mais para um país como a Síria, porque o Egito já passou da fase aguda do processo. Enquanto na Síria as forças de segurança mataram mais 21 manifestantes.
Veja também:
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